A modernização da década de 1920 deu lugar ao conservadorismo religioso e atinge cristãos

Fonte: Portas Abertas

Desde 1923, a Turquia comemora a Proclamação da República no dia 29 de outubro. A data é uma consequência do enfraquecimento do Império Otomano, da derrota na Primeira Guerra Mundial e da ocupação do território pelos países Aliados. Diante desses fracassos, Mustafa Kemal liderou uma resistência que deu início a reformas para a construção de um Estado moderno e laico, no qual a unidade política baseada na religião islâmica dava lugar à nacionalidade.


Da liderança da resistência, Mustafa Kemal ocupou a presidência do país e passou a ser chamado também de Atatürk (pai da Turquia, em turco). Ele começou a modernização com a expulsão da família real otomana em março de 1924. O fato foi um sinal de que o país caminhava para ser laico e as mudanças eram irreversíveis. Dentre as principais mudanças estavam a abolição da sharia (conjunto de leis islâmicas) e a adoção de uma adaptação do código civil suíço. Essas alterações legais permitiram que mulheres muçulmanas se casassem com homens de outras crenças e as pessoas pudessem mudar de religião.

Mustafa Kemal Atatürk foi o principal responsável pela modernização da Turquia


Quais as consequências da proclamação da República na Turquia?

Além das mudanças legais, todas as referências ao islamismo e demais crenças foram retiradas da legislação. Porém, boa parte dos líderes islâmicos enxergaram a atitude de modernização como apostasia, já que no islamismo não existe o conceito de laicidade e nem a diferenciação entre esfera jurídica e canônica.


Os impactos da modernização da Turquia foram sentidos no dia a dia da população das grandes cidades, como abolição do fez, chapéu usado pelos homens muçulmanos, e de outros acessórios para cobrir a cabeça das mulheres. Os seguidores de Maomé tiveram acesso à tradução do Alcorão em turco, o calendário gregoriano foi adotado, assim como o alfabeto latino, ao invés do árabe.


Segundo o líder maior do país na época, a religião não seria mais base para as decisões estatais. “O guia na vida política, social e educação será a ciência. O progresso é muito difícil ou mesmo impossível para as nações que insistem em preservar suas tradições e crenças que não tenham base racional”, discursou.

Até julho de 2020, Hagia Sophia era um dos pontos turísticos mais visitados no país


Foi neste período também que a mesquista de Hagia Sophia, que era uma igreja cristã antes do domínio otomano, passou a ser um museu secular. Outra decisão controversa foi a proibição das rádios turcas de transmitirem músicas orientais. As mudanças em nome da modernização da Turquia não foram bem aceitas por toda a população, principalmente pelos mais religiosos e habitantes de áreas rurais do território.


Como está a República da Turquia atualmente?

Hoje, a Turquia é governada pelo Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), composto por muçulmanos conservadores ligados aos principais líderes religiosos do país. O atual presidente, Recep Tayyip Erdogan, foi primeiro-ministro por 11 anos e, em 2014, ganhou as eleições por voto direto.

Recep Erdogan representa os líderes religiosos islâmicos da Turquia e não tem medido esforços para conseguir apoio popular (foto: BBC)


O líder está no poder desde 2003, estudou em uma escola islâmica e já foi preso em 1999 por “incitação religiosa” ao ler um poema de autoria própria, que incluía a seguinte frase: “As mesquitas são nossos quartéis, as cúpulas nossos capacetes e os fiéis nossos soldados”. Alguns opositores comparam Erdogan com os sultões do tempo do antigo império, já que ele governa com rigidez e pune com severidade os inimigos políticos.


Após a tentativa de golpe em 2016, o governo turco reagiu com violência e o resultado dos confrontos foi a morte de 240 pessoas. Além disso, 107 servidores públicos e soldados perderam os cargos, e mais de 50 mil pessoas foram presas e aguardam julgamento. Nem os acadêmicos e professores ficaram de fora da repressão, no total, 38 mil perderam os empregos.


Qual a situação dos cristãos na Turquia hoje?

A nação ocupa a 25ª posição na Lista Mundial da Perseguição 2021 porque os cristãos locais enfrentam paranoia ditatorial, hostilidade etno-religiosa, opressão islâmica, nacionalismo religioso e opressão do clã. Em julho de 2020, a Portas Abertas noticiou que a antiga igreja cristã Hagia Sophia tinha se transformado em mesquita novamente. A mesma decisão foi tomada em relação à Igreja de Santo Salvador em Chora.

Com a islamização do país, muitos cristãos turcos pensam em deixar o território


Além disso, cerca de 60 cristãos estrangeiros que viviam no território tiveram as autorizações de entrada no país proibidas. “Há uma atmosfera islâmica e nacionalista que torna isso desconfortável para os cristãos na Turquia”, afirma Yetvart Danzikyan, editor-chefe do jornal armênio de Istambul, Agos. O jornalista acrescenta que os seguidores de Jesus no país estão apreensivos com as decisões e muitos já pensam em deixar o território.


Quais as medidas internacionais a respeito da islamização da Turquia?

Para um analista de perseguição da Portas Abertas, as reconversões dos antigos museus em mesquitas devem ser analisadas como atitude para receber um maior apoio popular. “A economia está seriamente afetada pela pandemia e o presidente tem duas campanhas militares em andamento, na Síria e na Líbia, nas mãos. Nesse contexto, o elemento nacionalista, mostrando ao mundo que a Turquia é uma nação soberana que ousa enfrentar o Ocidente cristão, é provavelmente tão importante quanto o elemento religioso”, explica.


As atitudes contra as minorias cristãs do país colocaram a Turquia na lista especial do Departamento de Estado dos Estados Unidos. Por isso, a Comissão sobre Liberdade Religiosa e Internacional citou a nação no relatório de 2020 pela prática ou tolerância à violência de liberdade religiosa. O documento citou “a perpetuação de políticas governamentais restritivas e intrusivas sobre a prática religiosa e um aumento acentuado de incidentes de vandalismo e violência social contra minorias religiosas” como algo preocupante.


A Portas Abertas convida todos os cristãos brasileiros para interceder pelos irmãos e irmãs que vivem na Turquia e estão experimentando a islamização do país. Ore para que eles sejam protegidos e tenham convicção de permanecer no território para que o cristianismo não seja extinto no país.