Enquanto o mundo se volta para o massacre sofrido pelos muçulmanos Rohingya, cristãos morrem em uma ‘guerra esquecida’.
Em meio a um clamor internacional sobre atrocidades cometidas por forças do governo contra os Rohingya — um grupo étnico predominantemente muçulmano — em Mianmar, cerca de 1,6 milhão de cristãos na região norte do país também estão sendo vítimas de genocídio também.
O contexto tem sido chamado de “guerra esquecida” e é cada vez mais referido como genocídio de cristãos no estado de Kachin – porque eles escolhem seguir Jesus em vez do budismo, que é a religião predominante no país.
Mais de 400 vilas e 300 igrejas destruídas
Longe das colinas enegrecidas e selvas queimadas de Rakhine, para onde os Rohingya foram enviados, gritando em seus assentamentos no ano passado, enquanto as forças militares incendiavam suas casas, fica o estado de Kachin, uma região montanhosa na fronteira com a China e a Índia, rica em recursos naturais, como âmbar e jade.
Os Kachin já comercializaram seus recursos naturais com os países vizinhos em troca de dinheiro, alimentos e têxteis. Agora, eles trocam por armas.
Representantes do Exército da Independência Kachin disseram à Sky News no início deste ano que o Tamadaw, o exército de Mianmar, os tem perseguido implacavelmente há anos. E enquanto o conflito é tão complicado quanto violento, alguns acreditam que o governo está tentando eliminá-los por completo, simplesmente porque esta população tem 95% de cristãos.
Segundo o site ‘The Crux’, os militares de Mianmar queimaram mais de 400 aldeias de maioria cristã e 300 igrejas em Kachin, deslocando cerca de 130 mil pessoas nos últimos sete anos. O ‘Christian Post’ também informou que mais de 7.000 pessoas fugiram de suas casas desde abril, quando o conflito se intensificou.
Para o cidadão local, Tang Seng, cuja história é descrita em um artigo publicado no The Guardian, cada um desses números é uma pessoa ao seu redor. Quando ouviu tiros perigosamente perto de sua aldeia, sua avó lhe implorou para matá-la. Em vez disso, ele a carregou nas costas até um campo de refugiados, marcando a quinta vez que ela teve que fugir de casa, devido ao conflito.
San Htoi, representante da Associação de Mulheres Kachin da Tailândia, disse ao The Guardian que ela acha que o conflito passou despercebido pelo resto do mundo. Ela disse que autoridades do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que recentemente visitaram Mianmar, entraram e saíram sem qualquer conhecimento do sofrimento vivido pelos Kachin.
“É uma guerra invisível”, disse ela.
Igreja: Esperança em meio ao genocídio
Mianmar, que é uma nação predominantemente budista, é a 24ª na lista de observação mundial da Missão Portas Abertas (EUA) sobre perseguição e intolerância religiosa. Em estados predominantemente cristãos, como o de Kachin e outros em Mianmar, mesmo as igrejas históricas bem estabelecidas acabam sofrendo ataques. Em alguns casos, em todo o país, monges budistas invadiram propriedades da igreja e construíram santuários budistas nas dependências das congregações, de acordo com informações coletadas pela Portas Abertas (EUA).
Uma fonte local anônima disse ao ‘World Watch Monitor’ que as igrejas em Kachin “estão fazendo o melhor possível para acomodar [aqueles] que fogem das zonas de guerra”, e estão doando alimentos e recursos apesar dos preços exorbitantes que lhes são impostos.
Para os moradores de Kachin deslocados pelos combates, as igrejas são um lugar de refúgio e segurança em meio ao tumulto de um conflito violento – mas, para as forças militares, as igrejas estão se tornando alvos para os ataques. Sut Nau Ndayu, presidente da Organização Nacional Kachin dos EUA, disse ao The Crux que o Tamadaw tem como alvo as igrejas porque elas são “o núcleo da comunidade” e que, ao destruí-las, os soldados estão destruindo a esperança do povo.
Além da religião, David Baulk, um especialista em direitos humanos de Mianmar, disse ao The Guardian que ele acredita que a violência é parte do “processo de paz” do governo – que ele disse ser “ditado pelo exército de Mianmar como o cano de uma arma”.
“É a violenta pacificação das nacionalidades étnicas”, disse ele.
Quem são os Kachin?
Das oito principais nacionalidades étnicas em Mianmar, a tribo Kachin foi a única que adotou o cristianismo. Cerca de 95% dos Kachin são crentes em Jesus Cristo.
O evangelho se espalhou entre os Kachin no século 19, devido ao trabalho dos missionários ocidentais. Por décadas, sua identidade religiosa dentro de um contexto budista sancionado pelo Estado levou-os a suportar o trabalho forçado, estupro e violência nas mãos do Tatmadaw. Incontáveis vezes, o povo Kachin foi abusado e pressionado a se retratar de sua fé cristã.
Quando o primeiro-ministro de Mianmar, U Nu declarou o budismo Theravada como a religião oficial do Estado na década de 1960, o Tatmadaw começou a atropelar o direito dos cristãos de Kachin de adorar. Milhares de Kachin pegaram em armas para protestar e se defender. O governo birmanês ainda os vê como agentes do Ocidente, desviantes do objetivo de unificação budista do país.
Apesar do fim do regime militar e da transição do governo birmanês para uma democracia em 2011, os Kachin permanecem desprezados – privados de muitas conveniências modernas e ainda vitimizados por serem uma minoria religiosa.
FONTE: GUIAME, COM INFORMAÇÕES DA PORTAS ABERTAS – EUA